De janeiro a agosto de 2019, o Brasil registrou 90.505 focos de incêndio, segundo dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). A quantidade é a maior registrada desde 2010, ano em que o Brasil sofreu uma severa seca e computou 137.701 focos de queimadas no mesmo período. O bioma Amazônia que compreende os Estados do Amazonas, Pará, Amapá, Acre, Rondônia, Roraima e partes do Maranhão, Tocantins e Mato Grosso foi o mais afetado, com 47.805 focos.
Entre os Estados, os recordistas em focos de incêndio de janeiro a agosto foram Mato Grosso (16.948 focos) e Pará (12.597). Os dois ocupam lugar de destaque na produção agropecuária nacional. O primeiro lidera o ranking de geração do Valor Bruto da Produção (VBP), o segundo detém o quinto maior rebanho bovino do país.
Em função dessa produção robusta e da alta incidência de focos, o agronegócio tem sido acusado de promover desmatamentos e queimadas. E isso prejudica a imagem do setor internacionalmente, estimulando a interrupção de contratos. A VF Corporation, empresa americana dona de marcas como Kipling e Timberland, e a H&M, segunda maior varejista de moda do mundo, anunciaram a suspensão da compra de couro brasileiro após notícias que vinculavam o agronegócio com os incêndios na Amazônia.
Uma das reportagens que ganhou o mundo foi veiculada pelo jornal "Novo Progresso", da cidade de mesmo nome, no Pará. No dia 5 de agosto, o diário publicou uma notícia com o título "Dia do fogo Produtores planejam data para a queimada na região". O dia em questão era 10 de agosto, data escolhida por um grupo de WhatsApp que inclui produtores rurais, madeireiros, sindicalistas e grileiros para atear fogo nas margens da BR163, rodovia que liga Mato Grosso ao Pará.
Os líderes teriam programado o ato por se sentirem "respaldados" pelas palavras do presidente Jair Bolsonaro. "Precisamos mostrar para o presidente que queremos trabalhar, e o único jeito é derrubando. E, para formar e limpar nossas pastagens, é com fogo", disse um dos organizadores ao jornal.
De fato, naquela data, houve um boom no número de focos de queimadas na Amazônia. Segundo o Inpe, foram registrados 1.173 focos, o que levou o presidente da República a pedir para o ministro da Justiça, Sérgio Moro, acionar a Polícia Federal para investigar os incêndios criminosos na região.
Não foi um fato isolado. Parcela de fazendeiros envolvidos em crimes ambientais tem comprometido a credibilidade do agronegócio nacional e dos produtores e pecuaristas que atuam na legalidade. Isso motivou a Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura, mais conhecida como Coalizão Brasil, a publicar um manifesto dirigido ao presidente da República. Essa entidade é um movimento multissetorial e apartidário, que reúne mais de 200 membros que representam entidades do agro, empresas, meio acadêmico e ONGs ambientalistas (WWF e TNC, entre elas).
No documento, a entidade fala da preocupação com a escalada do desmatamento e das atividades ilegais na floresta e pedem ao Poder Público que use todos os instrumentos necessários para coibir essas práticas, que vêm manchando a imagem do agronegócio brasileiro. Segundo o manifesto, "mais de 90% do desmatamento na Amazônia é ilegal" e está relacionado a crimes como tráfico de drogas e evasão fiscal.
"É necessário retomar o controle do desmatamento. Já vivemos períodos em que uma queda significativa do desmatamento se deu em meio a um ciclo de saltos de produtividade na agropecuária. Esse histórico mostra que não é necessário desmatar para aumentar a produção agrícola", diz o manifesto.
De acordo com a Coalização Brasil, para o país garantir o posto de potência agroambiental são necessárias "políticas de governo centradas no enfrentamento da crise climática, no controle do desmatamento e da ilegalidade no campo e no fomento ao agronegócio sustentável, possibilitando não só o cumprimento do Acordo de Paris, mas também o aumento da ambição de suas metas para garantir a segurança climática, hídrica e alimentar do planeta", diz o documento.
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